terça-feira, 10 de maio de 2011

Ingredientes próximos de nossas casas - (Uma pequena crônica)

Tenho observado, nos programas especializados em culinária, uma crescente preocupação de cozinheiros, de diversas partes do mundo, em utilizar em sua cozinha ingredientes produzidos nas cercanias de seus restaurantes. Os motivos para essa conduta vão desde evitar os impactos ambientais do transporte desses alimentos, quando produzidos longe de casa, até a conseguir expressar em seus pratos a tipicidade da região em que vivem.
Confesso que, como cozinho apenas em casa e tenho um dia-a-dia carregado de afazeres relativos à minha profissão de fotógrafo, sempre busquei meus ingredientes na gôndola do supermercado. Isso acontece mesmo morando eu numa chácara, pois desisti da romântica idéia da produção de hortaliças depois de ver definhar meu canteiro de ervas por falta de cuidados com adubação. Juro que tentei, mas meus dotes de jardineiro deixam a desejar. Minha habilidade com enxadas, enxadões e afins é apenas eficaz na nobre causa de provocar risos nos vizinhos de cerca.
Tocado pelo movimento crescente entre os cozinheiros, e buscando um meio termo entre o produzir e apenas comprar, resolvi dar umas voltas aqui por perto para encontrar algo para minhas panelas.
Os resultados foram entusiasmantes. Minha cidade, Itupeva, é grande produtora de uvas de mesa, de cara consegui um fornecedor de folhas de uva e promovi uma verdadeira operação de guerra na cozinha de casa, num só dia fizemos trezentos Charutinhos, de arroz e carne, envoltos em folha de uva. Adoro a cozinha libanesa e esse é meu prato favorito dela.

Na semana seguinte parei o carro numa casinha, à beira de nossa estrada, em cujo terreno avistei uma grande horta. A senhora que me atendeu, Dona Maria, disse-me que tinha grande variedade de verduras, bastava eu pedir, que ela separaria tudo para mim. Pedi alface, cebolinha, coentro e tomates. Voltei em uma hora para busca-los já perfeitamente embalados. Cheguei em casa eufórico com os ingredientes frescos obtidos no vizinho. Pronto, podia estar em paz com minha consciência, estava colaborando com a economia de minha comunidade, reduzindo o impacto ambiental do transporte de alimentos produzidos em terras distantes e ainda expressando nas minhas criações gastronómicas a tipicidade do lugar onde moro, o puro sabor de minha terra. Isso é o que qualquer marqueteiro de plantão chamaria de cozinha com responsabilidade sócio-ambiental e cultural, uma verdadeira maravilha.
Ontem, voltei a bater à porta de Dona Maria para fazer um novo pedido, pois minhas panelas ansiavam por mais criações com os frutos da terra. Pensava numa Ratattouille, mas tinha certeza de que Dona Maria não teria todos os produtos necessários para tal receita. Estava enganado, ela tinha tudo: abobrinha, tomates tipo italiano, cebola roxa, beringela, pimentões maduros e até o alho, todos os ingredientes, apenas usaria de fora o azeite de oliva, mas isso no Brasil ainda não temos mesmo, estava mais do que perfeito.
Voltei em uma hora para buscar tudo, que já estava devidamente separado e embalado. Não aguentei e fiz um elogio a Dona Maria:
- Parabéns! A senhora aproveita muitíssimo bem sua terra. Deve ser muito trabalhoso produzir tantas variadas hortaliças num só lugar.
- Obrigada, Seo Francisco, mas a gente não produz tudo isso aqui não. Só temos alface e cheiro verde. A freguesia foi pedindo mais coisas e hoje eu busco tudo no Ceasa.
O bom e velho capitalismo me trouxe de volta à realidade e à gôndola do supermercado.

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